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sábado, 27 de novembro de 2010

Em Ngorongoro, número alto de visitantes pode intimidar guepardos

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Com tantas fotos e histórias sobre Ngorongoro, como fazer para escrever apenas uma crônica sobre essa maravilhosa cratera situada entre os vulcões da Tanzânia? Os momentos dentro da caldeira vulcânica foram inesquecíveis e quando fizemos o balanço final da viagem, o dia em Ngorongoro destacou-se como um dos 10 mais ricos! Um episódio engraçado – quase dramático – aconteceu com o Mikael no teto da Land Rover. Mas esse eu reservo para o livro “Luzes da África”…
Visitamos Ngorongoro em nosso carro, sem guia. Havíamos feito isso em outros parques, sempre com bons resultados. O único inconveniente de não ter um boa guia de vida selvagem conosco é quando precisamos de dois olhos de águia para encontrar carnívoros dissimulados.
Um grupo de gnus-azuis caminha às margens do lago central, no interior da cratera.
Não é o caso em Ngorongoro. Como os animais estão todos dentro da cratera, em uma área de apenas 260 km2, não existe muito espaço onde possam se esconder. Além do mais, quando alguém encontra um animal precioso – como um leão, uma hiena ou um guepardo – não demora mais de três minutos para que outro carro esteja ao seu lado. E se a cena for muito boa, em 10 minutos, haverá outros dez veículos.
É o que acontece no meio da manhã. Quando vimos uma meia dúzia de carros indo para uma mesma direção, deixando um rastro de poeira atrás, não foi difícil compreender que algum animal importante é o ponto magnético de convergência. Chegamos ao local e todos olhos, binóculos, câmeras e filmadoras convergem para um guepardo. O felino, considerado como o animal mais veloz do planeta, com picos que atingem 120 km/h, está sentado sobre suas patas traseiras e esquadrinha o horizonte em busca de alguma presa.
Um guepardo ou chita procura na savana alguma possível presa. Ao fundo, um gnu de cabeça abaixada e um jipe.
O guepardo não muda de posição durante vários minutos e os carros continuam chegando. Quando olho ao meu redor, fico pasmado. Conto 16 veículos, cada um com um mínimo de quatro passageiros. Todos os motoristas cumprem a regra de não sair da estrada principal de terra e mantêm distância dos animais, mas a verdade é que os carros formam uma verdadeira muralha, cortando metade do campo de visão do animal. Com tantos voyeurs, será que a chita tentaria alguma arrancada? Certamente, não.
Alguns dos 16 veículos que se agruparam para observar o guepardo na savana de Ngorongoro.
De fato, pesquisadores e guarda-parques têm chegado à conclusão de que um grande número de visitantes rodeando um único animal selvagem pode causar algum estresse. O efeito mais negativo é inibir a iniciativa para caçar. Mesmo se o guepardo pode chegar a 100 km/h em apenas três segundos (mesma aceleração que uma Ferrari), a perseguição tem um elevado custo energético. Por isso, o guepardo só irá investir em uma corrida quando ele estiver quase certo que ele conseguirá o prêmio.
Cansado de tantos olhares, o guepardo se levanta e caminha em direção contrária à manada de jipes. Aproveito para sair antes dos outros veículos, evitando a nuvem de poeira que será erguida. O episódio passa a ser motivo de conversa entre Mikael e eu e discutimos as vantagens e desvantagens do turismo de natureza.
Por um lado, a Tanzânia precisa das divisas trazidas pelos turistas estrangeiros. As entradas cobradas também fortalecem o trabalho conservacionista nas reservas. Por outro, a observação de animais na natureza é considerada, por muitos, como um momento mágico – mas quando você está rodeado por outras cem pessoas, essa magia pode desaparecer em um piscar de olhos. Os animais carnívoros também podem se sentir intimidados ao caçar, o que tem um impacto em sua dieta alimentar.
Por isso, é indispensável que o turismo de natureza seja regido por normas que busquem a sustentabilidade do lugar. No caso de Ngorongoro é simples: é preciso limitar o número de jipes por dia dentro da cratera.
Um bônus por ter sido o primeiro a deixar o grupo de jipes: uma hiena pintada sai do mato e atravessa a pista de terra.

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