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sábado, 14 de maio de 2011

Seu bebê é o que você come

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12/05/2011 | 08:00 | Marcela Buscato | Saúde | , , ,

Nenhum lugar no mundo parece mais seguro do que a barriga materna. Dentro do útero, o bebê flutua em quase 1 litro de líquido amniótico, uma mistura de água e fluidos da mãe e da criança que mantém a temperatura constante e protege a nova vida de impactos externos. A placenta, a conexão do bebê com o exterior, funciona como um filtro. O tecido de 4 centímetros de espessura, colado à parede do útero e repleto de vasos sanguíneos, leva oxigênio e nutrientes para o bebê e manda embora gás carbônico e impurezas. Mas todo esse aparato de segurança provido pela natureza é inócuo para proteger o bebê de um perigo prosaico: a alimentação materna. Uma nova safra de estudos, baseados nos avanços da genética, está ajudando os pesquisadores a entender por que aquilo que a mãe come tem o poder de influenciar na saúde do filho até mesmo na vida adulta. As pesquisas sugerem que a alimentação materna pode moldar o funcionamento do organismo do bebê para o resto da vida. O bebê gordinho de hoje pode virar a criança reconchuda de amanhã e o adulto obeso do futuro.
Depois de compilar por décadas estatísticas sobre nascimentos, os cientistas concluíram que mães obesas têm entre 42% e 63% mais chances de dar a luz a bebês que se tornarão crianças obesas e adultos obesos. No futuro, os quilos a mais freqüentemente se traduzem em problemas de saúde, como diabetes, hipertensão e doenças cardíacas. Um dos estudos mais recentes, publicado no ano passado pelo Lancet, um prestigiado periódico médico, conseguiu determinar a exata relação entre o peso da mãe e do filho. A pesquisa com mais de 510 mil americanas sugere que cada quilo ganho pela mãe na gravidez aumente o peso do bebê em 9,5 gramas ao nascer. Uma mulher que engorde 20 quilos, por exemplo, terá duplicado as chances de ter um bebê com mais de 4 quilos, peso considerado acima da média. As recomendações médicas sugerem que as gestantes ganhem, no máximo, 20% do peso ideal. A médica americana Emily Oken, da Universidade Harvard, conseguiu mostrar que os quilos extras afetam o organismo da criança desde o ventre. Emily estudou mais de 1 mil gestantes e concluiu que os filhos de mães que ganharam mais peso do que o recomendado tinham chances quatro vezes maiores de serem crianças obesas aos 3 anos. E, ao nascer, a pressão arterial de bebês de mães obesas era mais alta. Para cada 5 quilos ganhos na gestão, a pressão arterial do bebê aumentou 0,60 mm Hg.

Como a alimentação materna afeta o bebê

Os cientistas desconfiam que átomos dos nutrientes ingeridos pela mãe podem se ligar aos genes do filho. Esse processo não altera a estrutura do gene, mas é capaz de ligá-lo ou desligá-lo. Os fetos seriam especialmente sensíveis a esse tipo de mudança porque a velocidade do crescimento na barriga da mãe é muito acelerada. Os médicos ainda não sabem ao certo quais alimentos podem ter esse tipo de efeito. Mas já há bons indícios de que uma alimentação rica em gordura e açúcar pode afetar o metabolismo do feto para o resto da vida.
A janela de oportunidade para alterar o metabolismo infantil continua depois do nascimento. Pelo menos é o que indicam estudos que analisam os efeitos dos suplementos nutricionais, como as fórmulas lácteas, no desenvolvimento de bebês. Os cientistas estão começando a desconfiar que o nível de proteínas presente nessas fórmulas é muito maior do que deveria, o que contribuiria para criar bebês mais gordos e com mais chances de desenvolver diabetes, hipertensão e doenças cardíacas no futuro. Quando as fórmulas foram criadas, no início da década de 1970, os fabricantes tiraram tudo o que tinha de ruim no leite de vaca integral, como o excesso de gordura, e incorporaram mais proteínas do que havia no leite materno. Pensava-se que elas fariam bem porque ajudam o bebê a crescer. O problema é que ainda não se sabia como o excesso poderia interferir na intricada rede processos do nosso organismo. É essa cadeia de reações que os cientistas estão começando a desvendar agora.
Os leites artificiais podem causar obesidade?
O excesso de proteínas nos primeiros meses de vida estaria por trás de alguns desses processos. A equipe do pediatra alemão Berthold Koletzko, pesquisador da Universidade de Munique, estudou mais de 1 mil crianças européias. E concluiu que os bebês que consumiam fórmulas ricas em proteínas (4,4 gramas por100 calorias) ganharam mais peso do que os alimentados com fórmulas mais fracas (2,2 gramas a cada 100 calorias). Mas não houve nenhuma diferença no comprimento das crianças, indício de que diminuir a quantidade de proteínas não prejudicaria o crescimento.
A hipótese de Koletzko é que o consumo exagerado de proteínas estimula a produção de substâncias que favorecem a proliferação de células de gordura. Ainda não há um consenso sobre a composição mais adequada das fórmulas artificiais. “Algumas empresas já estão diminuindo a quantia de proteínas, mas ainda é preciso estudar mais esse assunto”, diz o pediatra Cláudio Leone, professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. “Agora que sabemos que a primeira infância é fundamental para determinar o funcionamento do organismo, é preciso mais cautela para criar consensos. Senão, daqui a 15 anos, teremos criado uma geração de desnutridos e não de obesos.” Vale lembrar que a recomendação da Organização Mundial da Saúde é alimentar os bebês até seis meses de idade exclusivamente com leite materno.
As novas descobertas sobre como o ambiente intra-uterino pode comprometer a saúde dos filhos até na vida adulta deixam qualquer futura mãe angustiada. Como ainda falta muito para os médicos entenderem quais alimentos podem ou não influenciar o desenvolvimento infantil, a melhor estratégia é adotar uma alimentação equilibrada – um ótimo exemplo para as crianças seguirem no futuro. “As mães não devem se preocupar com tudo o que elas comem”, diz o pediatra e nutrólogo Fabio Ancona, professor da Universidade Federal de São Paulo. “Elas só precisam comer bem.”

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