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sábado, 21 de maio de 2016

Quero transar com outras pessoas, mas não quero me separar. O que eu faço?

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Cena do filme "Os Sonhadores", de Bernardo Bertolucci, de 2003
Cena do filme “Os Sonhadores”, de Bernardo Bertolucci, de 2003
Meninas, a vida, sem um pingo de dúvidas no meio do caminho, é qualquer coisa. Quem respira – você e eu – precisa escolher. Não há moleza na vida. Olhar prum lado é deixar de ver tudo o que está ali pela nuca. Uma girada qualquer contém a escuridão daquilo que abrimos mão de enxergar.
Esse, moças, é o tom da dúvida de hoje:
“João, eu sou tipo casada há 5 anos. De uns tempos pra cá, eu venho sentindo muita falta de transar com gente diferente. Eu acho que todo casal, de algum jeito, enfrenta essa sombra. Mas comigo o negócio está bem forte. Eu sei também que é um clichê, mas a coisa que mais bate é que eu tou com saudade daquela trepada sem preguiça, das surpresas, do fôlego que dura a noite toda, de ouvir uma gemida diferente… Sei lá. Eu sei que todo mundo vai no mínimo lembrar como é um pouco viciante aquela sensação de novidade.
Mas aí eu olho pro lado e vejo o amor da minha vida…
João, ele é o homem da minha vida. Amo, gosto, companheiro, transa legal… Só que não consigo tirar de mim essa vontade de experimentar mais coisas… Como é que a gente lida com isso? Como é que a gente não se sente um verme com isso? Por que é que as coisas são assim? Eu sei que se descobrisse nele esse mesmo impulso, acho que me incomodaria. Ou talvez não agora, já que sinto a mesma vontade. Mas é confuso. Estou bem confusa. Queria entender se existe alguma possibilidade de ter as duas coisas… E que escolhe eu deveria fazer, caso não haja?”
AS MUITAS ESCOLHAS A CADA ESCOLHA
Meninas, a escolha certa eu não sei dizer. Nem acho que exista. Mas eu sei entender o impulso que moveu ao teclado o dedinho de moça aí de cima. Difícil a questão. Porque tirando todos os preconceitos e juízos dessa moralidade meio de fantasia que a gente abraça e amarra ao amor, a verdade é que a carta acima, em algum momento, diz, disse e dirá muitas coisas a cada um de nós. Todo mundo aqui e aí já foi um pouco essa carta.
Eu poderia até me repetir ali em cima e dizer que vida é escolha. Então, basicamente, se você quiser a resposta básica, ela seria: escolha. Decida. Não dá pra ter tudo. Uma coisa ou outra.
Mas talvez, pensando bem, a solução pode se encontrar num meio do caminho. Talvez exista outras e novas formas. Talvez dê pra ter uma coisa e outra. Sei lá, eu talvez queira dizer hoje algo um pouco diferente.
Talvez, por fim, eu queira mesmo é levantar a tampa e deixar sair um pouco do que há escondido nesse pote chamado amor.
O QUE É CERTO, O QUE É ERRADO?
Eu acho, moças, que a gente criou uma bela e dolorida armadilha quando a gente criou essa imagem do amor que dura pra sempre. Ou melhor, quando a gente criou essa imagem do amor que é sorriso, exclusividade e conexão eterna. Assim, tudo o que não for isso, é fracasso.
Ao criar o amor perfeito nós nos condenamos ao fracasso perfeito. Nunca fracassamos em fracassar.
Nossa história é a história de desejar o máximo fazendo o mais ou menos.
Porque, pra completar, nós acreditamos que amor é posse. Achamos que é um acerto entre duas pessoas em que cada uma das partes espera do outro aquilo que ela, no fundo, imagina ser o outro. E é assim que começamos a naufragar: ninguém pode cumprir o ideal que esperamos do parceiro. Ele sempre será a sombra daquilo que imaginávamos que fosse. Ele sempre será uma farsa, um engano. Depositamos, assim, no nosso amor um fiasco que, no fundo, é culpa nossa.
O ponto é que estes nossos tempos, cheios de dúvidas, golpes que a vida nos dá, e redes sociais como um espelho daquilo que gostaríamos de ser; estes tempos deixaram tudo meio com cara de um teatro em que dá pra ver lá atrás o ator se maquiando. Cada dia mais o amor perfeito tem a cara do photoshop mal feito.
UMA FIDELIDADE DE ARAQUE
Meninas, você e eu nascemos acreditando num amor ideal que parece, cada dia mais, um amor meio fajuto, irreal, dolorido. Exigimos do outro aquilo que não queremos nem podemos dar ao outro.
Evidentemente, nas fases em que as coisas vão bem, em que a gente se sente inteiro ao lado do outro, qualquer coisa além disso soa como bobagem e fraqueza. Ficamos ofendidos diante de qualquer desconfiança sobre a perenidade do casal. Mas se nós somos essas pessoas seguras às vezes, nós certamente voltaremos a ser as pessoas que duvidam daquilo ali mais tarde.
A gente duvida da gente o tempo todo, garotas. Nossa vida é ciclo, alto e baixo, mais baixo que alto.
Somos mil e dois. Às vezes no mesmo dia.
O que eu quero dizer com isso é que em algum momento vamos chegar a uma crise existencial de amor. Vamos ter de encarar isso. Vamos precisar repensar se essa coisa de que amor é um contrato de almas que se encontram ainda vale. Será possível, num mundo de Tinders, Snapchats, nudes e ZapZaps secretos, crer que o amor é só essa coisa Doriana, estável, ensolarada? Ou será que o amor, apesar de Tinders, nudes, Snaps e Zaps, será a única força capaz de resistir a todo tipo de tentação da carne?
Eu não sei ainda dizer. Talvez nunca saiba. Mas gosto de acreditar que o amor é as duas coisas, depende do dia, do mês, da fase.
Por isso, diante da confusão sem fim, alguns conselhos práticos.
CINCO CONSELHOS
O primeiro deles: cada casal sabe o acordo que funciona e não funciona. Se não sabe, deveria descobrir. Às vezes, esses acordos são silenciosos. Tenho um amigo que gosta de contar o seguinte: ele e a mulher nunca disseram isso às claras, mas aos poucos, em tom de brincadeira, combinaram algo sério. Basicamente o acerto deles é: cada um faz o que quer, desde que faça dum jeito a não deixar o outro saber o que fez. O que o olho e o ouvido não sabem, o coração não sofre.
O segundo conselho: tente entender e respeitar o olhar do parceiro em relação ao tema fidelidade. Se o que você sente fere aquilo que o outro espera de você, o ideal é você aceitar isso e partir pra carreira solo, sob o risco de machucar a si mesma e ao parceiro depois. Depositar no outro uma mudança que deveria ser sua é covardia.
O terceiro conselho: se o casal tiver uma liberdade mais evoluída, vale conversar. Uma dúvida é uma dúvida. E pode ser resolvida a dois. Talvez esteja na hora de a gente parar de fazer como as crianças fazem: tapar os ouvidos e os olhos pra o fato de que todos nós, sem exceção, em menor ou maior intensidade, em algum momento, pensará ou sentirá algo por alguém diferente, novo. E se assim é, por que um casal mais aberto não poderia ao menos discutir a respeito?
O quarto conselho: se o desejo de pular a cerca for incontornável, às vezes é melhor abrir oficialmente a porteira, conversando com o parceiro, pedindo um tempo, terminando, investigando esse desejo. É pesado, rende uma confusão dos diabos, mas deixa as coisas às claras. Evidentemente, no mundo ideal, a gente poderia voltar pro antigo amor quando o desejo esfriasse. O amor esperaria. Evidentemente, quase nunca isso acontece. Mas, enfim, talvez esse tipo de sinceridade seja inescapável.
O último conselho: uma amiga já me disse que quando ela realmente sente um tesão incontrolável, ela vai lá e faz, mais ou menos na linha do que o meu amigo do conselho número um faz: a única regra que ela se impôs (porque ela nunca nem sugeriu isso ao namorado) é ser discreta e não deixar o companheiro saber. Em troca, ela também finge que tudo bem qualquer desconfiança que ela tiver em relação a ele. Ou seja, ela diz que se tornou mais leve. Ela matou o ciúme no relacionamento. Explica a amiga que depois de começar a fazer isso, o namoro se tornou mais leve um paraíso de água calmas (antes era tenso e por um fio). Claro, às vezes bate o medo de que ela seja descoberta. Mas tem dias que ela desconfia que ele até sabe, mas viu que esse arranjo manteve os dois juntos e felizes. A santa e conveniente ignorância.
Portanto:
Não há solução. Eu sou a favor dos arranjos possíveis e de viver as confusões a pleno. Acho que o amor foi criado pra ser irreal e ser descoberto. Que entre duas pessoas cabe qualquer acerto. E desacerto. Porque o amor, no fim, ao ser insanamente confuso e com uma aura de eternidade, preenche a nossa vida, numa jornada sem fim rumo a uma coisa sem fim. Isso também é libertador: porque o certo e o errado dependem muito.
Se estamos fadados a falhar, estamos fadados a começar de novo.
Meu ponto: não machuque o parceiro. Se o seu desejo é muito forte, e você sabe que o seu namorado não toparia o jogo de ciscar aqui e ali, seja forte, não machuque o sujeito. Amor da vida ou não. Porque cuidado: às vezes a carta “amor da vida” é só um macete pra gente não abrir mão de alguém. É egoísmo.
Seja levando as coisas em silêncio seja puxando o fôlego, terminando o relacionamento e vivendo a aventura que for pra viver, é você quem decide.
Amor da vida ou não, a vida é isso, 50% de nada, 50% de tudo.
A fórmula de um é o erro do outro. Cada casal contém a própria solução.
Arrisca.

http://colunas.revistamarieclaire.globo.com/falecomele/2016/05/21/quero-transar-com-outras-pessoas-mas-nao-quero-me-separar-o-que-eu-faco/

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